O
novo regime de importação argentino, que entra em vigor no próximo dia
1º de fevereiro, provocou um curto-circuito nas relações comerciais
entre o Brasil e a Argentina - os dois maiores sócios do Mercosul,
bloco econômico integrado também pelo Paraguai e Uruguai.
Ontem
(19), a ministra da Indústria argentina, Débora Giorgi, disse que o
Brasil está sendo favorecido pelo comércio bilateral e que a realidade
"não justifica os comentários" do ministro brasileiro do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel.
A
ministra se referia à entrevista dada pelo colega brasileiro,
quarta-feira (18), nos Estados Unidos, e publicada hoje com destaque
pela imprensa argentina, na qual admite que "a Argentina tem sido um
problema permanente", no que diz respeito às relações econômicas.
Debora
Giorgi reagiu lembrando que, em 2011, o Brasil registrou um superávit
em sua balança comercial de US$ 30 bilhões e que a Argentina foi
responsável por 19,5 por cento deste saldo favorável. No ano passado,
acrescentou a ministra, as importações argentinas de produtos
brasileiros aumentaram 23% em relação a 2010. Dos US$ 22,7 bilhões
exportados pelo Brasil para a Argentina, 95% foram de produtos
manufaturados.
As
declarações dos dois ministros ocorrem após o anúncio do governo
argentino sobre medidas relacionadas ao comércio entre os dois países.
Na semana passada, os importadores locais foram informados de que, a
partir de fevereiro, terão que apresentar uma declaração juramentada
antecipada na Receita Federal argentina. E que os pedidos de importação
serão examinados e autorizados pelo secretário do Comercio Interior,
Guillermo Moreno, em um prazo de 15 dias.
Esta
semana, o ministro do Planejamento, Julio De Vido, mandou investigar a
Petrobras e e mais quatro companhias petrolíferas, acusadas por
empresas de transporte publico e de cargas, de formação de cartel para
aplicar sobrepreços ao óleo diesel.
A
presidenta Cristina Kirchner, após ser reeleita com 54% dos votos, em
outubro passado, tem adotado uma serie de medidas com um único
objetivo: evitar que a Argentina tenha um problema de caixa. Desde
2003, quando os Kirchner chegaram ao poder, a economia do país tem
crescido em media 7%, permitindo se recuperar da crise de 2001 - a mais
séria de sua recente história. Até agora, no entanto, a Argentina não
foi afetada pela crise nos Estados Unidos e na Europa. Mas 2012 promete
ser um ano difícil.
"O
crescimento econômico argentino não depende tanto dos Estados Unidos e
da Europa, mas depende do Brasil e da China. E o crescimento desses
dois países foi afetado pela crise mundial. É natural que a
desaceleração das economias brasileira e chilena afetem a Argentina",
disse a Agência Brasil, o economista Fausto Spotorno.
Sem
acesso a crédito externo, desde que declarou a moratória da dívida
externa em 2001, a Argentina depende das exportações para fazer caixa.
Por isso o governo quer manter o saldo na balança comercial de US$ 10,5
bilhões, registrado em 2011. Mas analistas da área econômica acham
difícil cumprir esta meta.
"A
atividade econômica crescerá menos este ano, cerca de 3,5%. E as
exportações devem crescer pouco. Já os gastos com a importação de
energia deverão aumentar muito", declarou à Agencia Brasil o economista
Marcelo Elisondo, diretor da consultora DNI. Só com a compra de gás e
energia elétrica, segundo ele, o país deve gastar este ano US$ 7
bilhões. "O governo precisa limitar as importações para ter dinheiro
para importar energia", disse.
Hoje,
o governo argentino se reuniu com os importadores para explicar como
funcionará o novo sistema. "Entendemos que o governo tenha anunciado o
novo regime de importação com tanta pressa e sem muito tato. Teme que a
seca afete a produção agrícola", disse à Agencia Brasil, Miguel Ponce,
gerente de Relações Institucionais da Câmara de Importadores Argentinos
(Cira).
"Se
o sistema inaugurado for transparente e rápido, poderá representar uma
melhora. Agora sabemos que a política de importação está nas mãos de
Guillermo Moreno, e esperamos que este sistema seja mais eficiente que
as licenças não automáticas (LNA). Pelas as normas da Organização
Mundial do Comércio (OMC), produtos importados por este regime devem
entrar no país em no máximo 60 dias. Mas o governo argentino mais de
uma vez atrasou a liberação das importações", lembrou.
Segundo
o especialista em comércio exterior, Mauricio Claveri, por serem os
dois principais sócios do Mercosul, o Brasil e a Argentina têm
capacidade de negociar soluções políticas para seus problemas
comerciais. "Em 2011 a Argentina estava em um ano eleitoral. Mas agora
que Cristina foi reeleita para quatro anos e assegurou a maioria no
Congresso, não acho que o governo brasileiro continuará sendo tão
tolerante como antes", declarou Claveri.